... A P A L A V R A ...
...A escrita torna-nos selvagens. Regressamos a uma selvajaria de antes da vida. E reconhecêmo-la sempre, é a das florestas, tão velha como o tempo. A do medo de tudo, distinta e inseparável da própria vida. Ficamos obstinados. Não podemos escrever sem a força do corpo. É preciso sermos mais fortes que nós para abordar a escrita, é preciso ser-se mais forte do que aquilo que se escreve. É uma coisa estranha, sim. Não é apenas a escrita, o escrito, são os gritos dos animais da noite, os de todos, os vossos e os meus, os dos cães. É a vulgaridade maciça, desesperante, da sociedade. A dor é, também, Cristo e Moisés e os faraós e todos os judeus e todas as crianças judias e é, também, o lado mais violento da felicidade. Acredito nisso, sempre... Marguerite Duras, in "Escrever"
A palavra é segredo
Reproduz sons e vibrações inaudíveis
O desaparecimento da expressão do corpo
Faz da solidão um riso barroco
A suposição maléfica, errante – faz da fumaça um excesso vulgar
Na ausência da água insinua-se o sinônimo da sede
Na surda causa do Tempo, a palavra consolida consoantes acalentadas
Perturbada já a serenidade – linhas não são caminhos
Nem revoluções, apenas silenciosas cascas quebradas
Na ausência do rosto insinua-se o antônimo da suavidade
E assim o som se fez segredo
No coração inconstante dos dias – da idade vácua visual
Subverte-se o verbo diminuto, a escrita não representa – ela acontece
Evidente terrível de isolamento incompreensível – indelével
Da árvore cai o fruto que virou pedra, atônito olhar frígido
Vai pontuando com cravos enferrujados, vital sentido do clamor no exílio
Arde o corpo com dor imprecisa – interior - facial
Agora a face vira palavra.
Everaldo Ygor
Maio 2008 & Maio 2009.