Invernada Verão
O verão virou inverno, deixou de acolher as vozes de ternura e poesia. Escureceu deixando de projetar as cores inquietas.
São poucas as nuvens que rasgam...
No silêncio do vento que vem do norte, tento decifrar essa linha tênue e fria que vai até o coração. Sinto que o Sol está lá escondido, fugindo da chuva cinza. Assim a chuva acida não vai arder em chagas reabertas. As palavras íntimas pedem recesso aos olhos comovidos, pois tiveram presença na desesperança da guerra. Os olhos estão secos, sem lágrimas, míopes diante tamanha invernada. Fico sem ansiar pelo anoitecer, muito menos pelo amanhecer, caminho apenas em superfícies mornas sonhando com gestos íntimos de poesia livre.
Ávido é o desejo por um novo coração, nova canção, livre da empunhadura de botas, fuzis e capacetes, espírito novo e purificado, fecundo de novas criações. Para essa estação, minha oferta do dia é um chá de Jasmim, vai acalentar esse inverno, líquido quente que me enternece o chegar, espalha perfume de flores e cores, faz minha voz transpor sombras, olhares, ilhas e fugas.
Sem consciência do que tenho sido, conquistado e imediatamente perdido. A virtude fria de cada manhã faz humilde e trêmulo o Ser que empunha o coração, ás vezes definha, mas mantém o punho cerrado diante o destino dessa invernada. Violento é o tempo que faz dilacerar as próprias palavras, inesgotável fonte temporal, insensível desgasta tudo, versos, Seres e até o inverno rigoroso. Para sair desse frio intenso, só lajeando o ardente Inferno de Dante, lá nem o aço, nem o ferro, nem o coração, nem os dias resistem. Amarga constatação, que recolhe em quimeras frágeis cada olhar. Colhe o soluço frio dos que sofrem. Faces geladas, oprimidas talvez, solitárias gélidas, impedidas de voar. Lírica é a palavra que é caminho, sonho, ternura e vastidão. É poesia!
Na mentira dessa verdade plena, fica o desabafo livre de verão inverno, instante adormecido na invernada que jaz imersa em montanha de gelo ancestral.
Everaldo Ygor
30.01.2008